O encontro não estava marcado, porém aquela esquina qualquer
estava aguardando o momento. Era final de tarde, porém faltava um bom tempo
para que o sol se escondesse atrás dos prédios da avenida. A avenida estava
mudada. Os antigos casarões e prédios baixos deram lugares às galerias e
grandes prédios. Entre estes últimos surgia a figura da moça.
Ela vinha, sem jeito, vestia orgulhosa um tecido de céu que
cobria tudo, e não deixava curvas para interpretar. Os olhos estavam cobertos
sob as lentes escuras. O cabelo não era nada demais. A falta de graça do resto
voltava os olhos para o vestido. Então é ele que importa.
O tecido era formado por pequenos cristais costurados com
cuidado por um fio quase invisível. Eram pequenos espelhos que mostravam o céu
com seu azul inconfundível. E foi nesse azul hipnotizante que os olhos do rapaz
pousaram. Ele esperava para atravessar, era algo simples, porém a fixação pelo
vestido fez com que esperasse. Os
compromissos podiam ficar para depois. Nada de tão importante.
Pediu um café e uma coxinha, ficou em uma mesa na calçada da
charmosa cafeteria. O toldo bordô tampava a única boa fresta que mostrava o
céu. Mas não importava. Aquele vestido estava na sua frente e mostrava tudo.
As horas passavam e o azul do vestido dava um lugar ao
vermelho alaranjado apaixonante do por
do sol. E a cada momento a conversa se tornava menos importante. Nenhum dos
dois se lembra qualquer assunto falado. Ele mal via o olhar, tampado pelos
óculos, para ter noção de se ela gostando do papo. Ficava jogando qualquer
coisa que vinha na cabeça na conversa e enquanto ela não ia embora, estava bem.
O vestido de vidro era uma joia sem preço. Cobriu de céu
toda a falta de jeito, toda a falta de carisma, etc. Atraia todos os olhares em
volta. O vermelho rubi refletia nos olhos do rapaz e no de todos em volta. Dona
Maria, que veio servir mais uma coxinha não tirava os olhos.
Café vai, conversa vem e foi caindo devagar a noite. E com
ela veio a surpresa. O que seria do tal vestido sem pela noite?
Com o ultimo suspiro do sol, a magia se perdeu. Lá estava a
garota. Desnuda. Na frente de todos os que antes estavam hipnotizados com o
brilho rubro, mas agora, com a visão inesperada do corpo sem tantos atrativos.
Mas não há como tanta pele exposta não chamar a atenção. Não tinha vergonha,
pois era o preço de usar tal joia. E ela não estava sozinha.
Dia seguinte seria a mesma coisa. Estava presa a esta sina
dia após dia. E estará para sempre. E todos aqueles que depositam tudo no
maravilhoso vestido de vidro.